sexta-feira, 21 de outubro de 2011

Resumo da mesa “O Romance e a Grande Literatura” - Carlos Barbosa, Jorge Araújo e Mayrant Gallo

foto: Vinícius Xavier


Mayrant Gallo, Carlos Barbosa e Jorge Araújo falaram da grande literatura, da produção e leitura de romances e conceitos, sob a mediação de Aurélio Schommer (substituindo Vagner Fernandes, que não pôde vir).

Literatura é liberdade, e essa liberdade se expressa de diversas formas. Mayrant começa falando de Machado de Assis e a dualidade de Capitu, que são exemplos da liberdade que se tem na prática literária. Mayrant explica que Capitu é constantemente comparada com o mar, uma coisa que não se pode conter ou controlar, que vai e vem, e que isso é uma grande pista sobre se ela traiu ou não Bentinho. Por fim, a plateia se manifestou dizendo que o mais importante de Dom Casmurro é a dúvida, não a solução do mistério.

Carlos começou falando sobre o significado da literatura em sua vida: “A literatura para mim é um aprendizado de vida. Ela entrou de maneira natural”. Para o poeta e romancista, o livro é um ímã. Sua formação veio antes da literatura que da prática. Aos onze anos Carlos já tinha lido todos os livros de Jorge Amado.

Mayrant é professor, e explicou que nessa função fica em segundo plano quando está escrevendo, assim com escritor fica de fora quando está lecionando. “Primeiro eu leio com as turmas, para então teorizar sobre literatura”.

Há escritores que produzem em grande velocidade, seja pela pressão da editora ou por um fluxo criativo repentino. Para Jorge Araújo, um processo muito elaboracionista pode desconstruir a espontaneidade. “Não adianta adotar a atitude de adoração da inspiração, que é uma deusa. Você está dotando e convivendo com outros mundos”, explica. Essa convivência com outros mundos durante as madrugadas fez com que Jorge criasse pavor por uma de suas personagens.

Machado de Assis voltou à pauta: qual seria a melhor obra do autor? Jorge explica que isso varia de acordo com o momento do leitor, mas que o momento em que Machado escreveu Memórias Póstumas de Brás Cubas torna este o melhor livro, na sua opinião.

Mayrant comentou que Dom Casmurro é um romance de leitura veloz, e isso o torna atraente. A velocidade seria, então, um entrave à qualidade? Quinze anos demorou Mayrant para escrever um livro, mas em outro momento demorou quinze dias. Carlos explica que nenhum escritor começa uma obra do zero, geralmente é uma história maturada.

A inspiração foi discutida por todos na mesa sob diversos prismas, sendo o da psicografia o mais polêmico. Aurélio Schommer comentou que é cético em relação a contatos do além, mas há momentos em que os romances vêm de um jeito que parecem terem sido psicografados.

Sob influência de uma inspiração súbita, Carlos mudou certa vez o final de um conto já acabado, em que o autor já sabia que mataria uma personagem. A nova inspiração fez com que a maneira dessa personagem morrer mudasse completamente, de modo que para ele o controle sobre aquele romance e todos os outros nunca é total.

“Às vezes a inspiração sobrenatural acontece de uma maneira tal que os dedos não acompanham os pensamentos e a ideia foge”, relatou Mayrant, que às vezes vai dormir pensando em algo e acorda com a ideia pronta.

Para Carlos, há também outras influências sobre o processo criativo atual, como a redação jornalística, que torna o texto mais simples. A pressão exercida pelos prazos das editoras é um ponto ruim porque não acompanha nem respeita o tempo de criação. “O narrador dentro de mim se atrasou porque estava andando em uma estrada acidentada. Quando ele finalmente chegou, narrou tudo em dois ou três dias e eu pude relaxar”, contou.

A redação de vestibular foi discutida pelos autores como sendo uma boa maneira de exercitar o pensamento do jovem, e assim fazê-lo atender as demandas de mercado, embora a ditadura da mídia, segundo Jorge, deva ser driblada. “A formalidade da literatura produz um desgostar que afasta as pessoas”, explicou.

“Obrigar alguém a escrever é bom?” Perguntou Aurélio. “Obrigar alguém a pensar é bom?” Retrucou Jorge. “Sem ler você só definha, sem ler você não é nada”, enfatizou. Para ele o Brasil e o mundo estão sofrendo uma “desertificação de ideias”. Mayrant comentou que a moda é um gosto de passagem, mesmo para os best sellers: “o que fica é o livro consistente”.

Quanto à técnica, “o romance é um texto sem forma”, explicou Mayrant. O que se vê hoje, segundo o professor, são novelas, que estão entre o conto e o romance. Os folhetins são formatos vinculados ao prazo, e por isso sua qualidade cairia um pouco. A liberdade que cabe no romance faz com que Carlos se sinta à vontade para fazer história, psicologia, antropologia e outras coisas dentro do texto.

A influência da academia na escrita entrou em pauta, e Carlos leu um texto para ilustrar o quanto a teorização pode limitar a capacidade criativa. Escolher o gênero não é tão importante quanto a inspiração. “Quando me vem uma ideia, não sei no que vai dar. Pode virar um conto, um poema ou um romance”, explica.

O mercado editorial, segundo Jorge, tem na atualidade a tendência de fazer do leitor um canal de recepção do produto. “parece que a livraria virou cemitério de livros, quando na escola a professora usa a biblioteca como castigo”. Os autores finalizaram defendendo que ler é um compromisso de cada um, as pessoas se tornam melhores quando leem.


Aline Cavalcante

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